Jumento brasileiro é uma espécie única no mundo e corre risco real de extinção – Foto: Divulgação | The Donkey Sanctuary
Indústria em xeque: campanha propõe fim do abate de jumentos na Bahia
A sobrevivência do jumento brasileiro, uma espécie única no mundo, está em jogo. Na Bahia, três frigoríficos – localizados em Simões Filho, Amargosa e Itapetinga – são os únicos no país com autorização para o abate de jumentos, uma prática extrativista que já causou a dizimação de 94% da população desses animais no Nordeste. Desde 2018, mais de 248 mil jumentos foram brutalmente mortos para a exportação de suas peles, matéria-prima para a produção de ejiao, um colágeno valorizado na medicina tradicional chinesa.
Abate e Sofrimento Animal: Denúncias e Condições Desumanas
A coordenadora da campanha da The Donkey Sanctuary no Brasil, Patrícia Tatemoto, pós-doutora em Medicina Veterinária pela USP, destaca a urgência da situação. “No Brasil, eles já são considerados um recurso genético. Isso significa que o genoma do jumento ocorre só aqui, ele é único, e conforme os abates avançam, a gente perde esse patrimônio”. Ela denuncia a forma cruel como os abates ocorrem: jumentos são transportados de diversas regiões do Nordeste para a Bahia em condições precárias, sem água, comida ou atendimento veterinário. “Muitos morrem antes mesmo de chegar aos abatedouros. Isso configura maus-tratos, conforme a legislação ambiental brasileira. E, pior: é uma atividade extrativista, sem qualquer cadeia produtiva estruturada ou fazendas de criação”.
Um Patrimônio em Risco: Ecológico, Econômico e Cultural
Além da questão ética, Tatemoto ressalta o papel multifacetado do jumento nordestino: ele foi eternizado na cultura e no imaginário popular, é fundamental para o equilíbrio ecológico em ecossistemas nativos e continua sendo vital para comunidades que dependem dele na produção de sisal e cacau. A crescente adoção como animais de companhia também demonstra seu valor. A perda desses animais representa uma perda irreparável para o Brasil.
Soluções Inovadoras e Obstáculos Legais
Diante da crise, surge uma esperança: a fermentação de precisão. Essa técnica biotecnológica permite a produção de colágeno em laboratório, eliminando a necessidade de abater animais. “Já usamos isso para produzir insulina. O Brasil pode estar na vanguarda da produção de proteínas alternativas. Isso evitaria os riscos sanitários, ambientais e reputacionais de um abate que não tem rastreabilidade, e abriria um novo mercado mais ético, seguro e sustentável”, afirma Tatemoto.
No entanto, o caminho para a proibição não é simples. O Projeto de Lei nº 24.465/2022, proposto pelo deputado José de Arimatéia (Republicanos-BA), busca banir o abate e já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da ALBA. Contudo, recebeu parecer contrário na Comissão de Agricultura, sob o argumento de inconstitucionalidade por afetar o livre comércio. Essa interpretação é veementemente criticada por 27 entidades, que em uma carta de repúdio, argumentam que a Constituição Federal proíbe atividades econômicas que ameacem espécies em risco de extinção.
A Mobilização Continua: Uma Campanha Por Vidas
A Frente Nacional de Defesa dos Jumentos, criada em 2016 e coordenada por Gislane Brandão, alerta para a urgência da aprovação da lei. “Estamos lutando contra esse abate extrativista que já findou com 94% dos jumentos nordestinos. Temos uma Ação Civil Pública em andamento, já conseguimos uma liminar judicial e seguimos mobilizando os deputados para que o PL seja aprovado em plenário”.
A campanha internacional Stop the Slaughter – Parem o Abate, promovida pela The Donkey Sanctuary, lança-se oficialmente hoje em um seminário internacional em Maceió (AL), que vai até sábado, 28 de junho. A iniciativa busca o apoio da população: através do site www.fimdoabate.com.br, é possível enviar uma carta aos parlamentares da Alba. Além disso, no site da Câmara dos Deputados, cidadãos podem votar na enquete sobre o PL 2387/2022, que propõe banir o abate de jumentos em todo o país.
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