"O Nó", a tragédia do cacau como ato de terrorismo

Geral
30 de Março de 2012 09h03

FILME DO PESQUISADOR DÍLSON ARAÚJO TRAZ UMA CADEIA DE DOCUMENTOS MOSTRANDO QUE A VASSOURA DE BRUXA NÃO FOI APENAS INTRODUZIDA DELIBERADAMENTE, MAS TAMBÉM DISSEMINADA. E REACENDE A FERIDA DA TRAGÉDIA. PRODUTORES ENDIVIDADOS FALAM EM BUSCAR INDENIZAÇÃO

 

No início da década passada, andando pela Região Cacaueira na construção da reportagem ‘Os órfãos do cacau’, da qual já falei, deparei-me com Raymundo Sá Barreto. Com ele, um ponto crucial da história que pretendíamos contar.

 

 

Sá Barreto não está mais entre nós para assistir o reavivamento dessa história por outro canal, com agravantes. Dílson Araújo, produtor cultural de Ipiaú, levou dois anos escarafunchando a tragédia da vassoura. Do trabalho resultou o documentário ‘O Nó – ato humano deliberado’, filme de uma hora e oito minutos de duração que ele produziu a duras penas ao custo de R$ 60 mil, entre ameaças de morte e briga contra a falta de dinheiro.

 

Nele, não só os suicídios voltam à cena, mas o pior: a vassoura de bruxa não foi obra do acaso e sim um ato deliberado, qualificado como terrorismo biológico. O fungo foi introduzido por volta de 1987, mas não só isso, foi também disseminado no início dos anos 90.

 

Tudo documentado, acrescido de depoimentos dos atores do cacau ainda vivos e testemunhas oculares dos inúmeros flagrantes de galhos secos amarrados aos troncos dos cacaueiros que na época alguns não ligaram, pensando tratar-se de macumba.

 

Muito mais que isso, traz também o depoimento de Luiz Henrique Franco Timóteo, itabunense radicado no Rio de Janeiro, por acaso, padrasto do goleiro Bruno, do Flamengo, preso acusado de ter mandado matar Elisa Samúdio, que confessa traquilamente ter sido um dos agentes da disseminação da vassoura, na chamada Operação Cruzeiro do Sul.

 

A motivação teria sido uma ameaça de fechamento da Ceplac. Espalhando a vassoura, a instituição, seriamente ameaçada de extinção, que com o ato teria uma nova razão de existir.

 

Conta Dílson:

 

- Talvez eles não tenham calculado o tamanho do estrago que provocariam.

 

Queima de arquivo

 

No caso da vassoura de bruxa, alguns detalhes eram sempre citados para levantar a suspeita. Se o fungo Crinipellis Perniciosa se espalha pelo vento, como ele saltou da fazenda de Chico Lima, em Uruçuca, o local do primeiro foco, para a de Luciano Santana, em Camacã, 90 quilômetros ao sul?

 

Mais: quem era Chico Lima? O presidente da União Democrática Ruralista, a famosa UDR, na região do cacau.

 

E quem era Luciano Santana? O maior produtor individual da América do Sul, líder político que tinha sido prefeito e deputado, carlista de quatro costados.

 

A documentação exibida no filme de Dílson Araújo tem o mérito de botar pé e cabeça nessa história. Especialmente a investigação da Polícia Federal, que não aponta nomes, mas atesta que foi um ‘ato humano deliberado’.

 

No bojo dos documentos aparece o nome de seis pessoas ligadas a Ceplac, entre elas, o de Geraldo Simões, ex-prefeito de Itabuna, hoje deputado federal. Fala-se também de um terceiro foco, em Ibirapitanga, sem especificar a fazenda e nem o proprietário.

 

Dílson conta que possui documentos da Ceplac que nem a própria Ceplac tem mais. Por quê? Queima (literalmente) de arquivo. Em determinado momento alguém da instituição ordenou que se tocasse fogo em toda a documentação pertinente ao caso. O encarregado da missão teve o cuidado de tirar cópias de grande parte antes de cumprir a ordem. Ele conversou com o dito cujo.

 

- Ainda é uma história de medo. A grande maioria dos atores, mandantes e vítimas, ainda está viva.

 

Em síntese, os arquivos vivos também têm medo de serem queimados.

 

Indenização, a palavra de ordem

 

Óbvio que a vastidão da tragédia provocada pela vassoura de bruxa nunca foi mensurado e talvez jamais seja. No atacado, atingiu 600 mil hectares de terras em 93 municípios atingindo diretamente três milhões de pessoas.

 

Provocou uma legião de 250 mil desempregados que passaram a habitar manguezais ao longo da costa sul da Bahia. Jogou na miséria os sem nada e os produtores, a grande maioria deles, ao contrário do que se fala, pequenos.

 

Hoje, a região do cacau ainda paga, e paga muito alto, o preço da tragédia. A disparada da violência e até a mudança do perfil das atividades econômicas, como a expectativa da mineração nas férteis terras do cacau, que sempre se orgulharam da convivência em plena harmonia com um meio ambiente saudável.

 

Restou para os médios e grandes, em torno de mil, uma dívida de quase R$ 1 bilhão, a maior parte dela, contraída justamente para combater a praga, a partir de orientações da Ceplac.

 

O advogado Carlos Amado, um dos depoentes do filme, sempre disse que o Estado é quem deve. Não se pode cobrar quando a dívida foi contraída por indução oficial de que era o caminho para livrar-se do mal.

 

Aguido Muniz, do Instituto Pensar Cacau, despreza a expressão ‘perdão da dívida’, bordão que era a chave dos discursos dos produtores endividados.

 

- O que nós queremos é indenização.

 

Provavelmente o governo jamais vai reconhecer o ato terrorista. Se o fizer, estará colocando nas mãos um pepino gigantesco. O filme de Dílson Araújo faz alusões a atentados como o do Word Trade Center, nos EUA, em setembro de 2001, para estabelecer um comparativo em termos trágicos.

 

Mas o cacau, que já foi a mola da economia baiana, está tão empobrecido quanto esquecido. O PAC do Cacau, lançado por Lula com festas e pompas em Ilhéus, foi uma ópera bufa. Não convenceu, não emplacou.

 

Até para divulgar o filme Dílson Araújo tem dificuldades. O público alvo é de falidos que luta contra um inimigo poderoso. Os petistas, eventualmente acusados de serem os autores do atentado e de fato suspeitos suspeitíssimos, agora estão no poder.

 

Fonte 247 Bahia

 

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