Após 13 anos no poder, Evo Morales renuncia à Presidência da Bolívia

Mundo
11 de Novembro de 2019 08h11

Morales deixa o cargo que ocupa desde 2006 depois de três semanas de protestos no país, por suspeita de fraude nas eleições de outubro, que haviam dado a ele um novo mandato.

Twitter: @ItapebiAcontece

 

 

"Houve um golpe cívico, político e policial. Meu pecado é ser indígena, líder sindical e plantador de coca", disse o agora ex-presidente boliviano, ao comunicar sua decisão em um pronunciamento na televisão ao lado do seu então vice-presidente, Álvaro García Linera.

Morales justificou sua renúncia para evitar a continuação da violência no país após três semanas de confrontos entre seus apoiadores e críticos. "A vida não acaba aqui, a luta continua", afirmou no final de seu discurso.

García Linera disse que também estava deixando o seu cargo. "O golpe foi consumado", afirmou Linera. A terceira na ordem de sucessão era a presidente do Senado, Adriana Salvatierra, que também anunciou sua renúncia. O quarto, Victor Borda, presidente da Câmara dos Deputados, também renunciou.

O artigo 169 da Constituição boliviana diz que, "em caso de impedimento ou ausência permanente do presidente do Estado, será substituído no cargo pelo vice-presidente e, na ausência deste, pelo presidente do Senado, e na ausência deste, pelo presidente da Câmara dos Deputados. Neste último caso, novas eleições serão convocadas no prazo máximo de noventa dias".

Em declarações à emissora de televisão Unitel, a segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Áñez, disse que estava disposta a assumir temporariamente, se necessário, diante das renúncias em série. "Na ordem constitucional, seria minha responsabilidade assumir esse desafio com o único objetivo de convocar novas eleições", afirmou.

No entanto, como a própria Áñez esclareceu, o Legislativo deveria ser consultado para levar em conta as renúncias e resolver a questão de quem deve assumir a Presidência.

As reações na América Latina

O ex-presidente Carlos Mesa, que ficou em segundo nas eleições de outubro, comemorou o anúncio falando sobre um "fim da tirania".

"À Bolívia, ao seu povo, aos jovens, às mulheres, ao heroísmo da resistência pacífica. Eu nunca esquecerei este dia único. O fim da tirania. Grato como boliviano por esta lição histórica. Viva a Bolívia!!!!!", publicou Mesa em sua conta no Twitter.

 

 

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) comentou a renúncia de Morales. "Denúncias de fraudes nas eleições culminaram na renúncia do presidente Evo Morales. A lição que fica para nós é a necessidade, em nome da democracia e transparência, contagem de votos que possam ser auditados. O VOTO IMPRESSO é sinal de clareza para o Brasil!", disse.

O ex-presidente Lula lamentou a saída de Morales do cargo. "Acabo de saber que houve um golpe de Estado na Bolívia e que o companheiro @evoespueblo foi obrigado a renunciar. É lamentável que a América Latina tenha uma elite econômica que não saiba conviver com a democracia e com a inclusão social dos mais pobres", afirmou.

O presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, afirmou que um "golpe de Estado se consumou" na Bolívia e classificou os fatos como uma "quebra institucional". "Nós, defensores das instituições democráticas, repudiamos a violência desencadeada que impediu @evoespueblo de concluir seu mandato presidencial e alterou o curso do processo eleitoral", disse ele.

"Vamos defender fortemente a democracia em toda a América Latina. Após esse colapso institucional, a Bolívia deve retornar o mais rápido possível ao caminho da democracia através do voto popular."

Os governos de Cuba e da Venezuela, que já haviam manifestado seu apoio a Morales, também consideraram estes acontecimentos um "golpe". O presidente cubano Miguel Diaz-Canel disse ter ocorrido um ato "violento e covarde" contra a democracia, enquanto o líder venezuelano Nicolas Maduro afirmou: "Condenamos categoricamente o golpe realizado contra nosso irmão".

Forças Armadas haviam 'sugerido' renúncia a Morales

Pouco antes de Morales renunciar, as Forças Armadas haviam pedido que Morales abrisse mão de seu mandato para permitir a pacificação e manutenção da estabilidade do país.

O comandante das Forças Armadas da Bolívia, general Williams Kaliman, divulgou um comunicado em que falou que a saída de Morales seria importante para resolver o impasse na crise política em que se encontra o país desde as controversas eleições presidenciais, em 20 de outubro.

Segundo o comunicado, o pedido foi feito a Morales levando em consideração "a escalada de conflitos que o país atravessa", em nome da "vida e da segurança da população" e para garantir o "império da condição política do Estado, de acordo com Artigo 20 da Lei Orgânica das Forças Armadas e após análise da situação interna de conflito".

 

 

Depois de quase três semanas de protestos nas ruas contra os resultados que haviam dado a Morales um novo mandato até 2025, o presidente boliviano havia anunciado na manhã de hoje novas eleições. Essa medida, no entanto, não acalmou os manifestantes e foi considerada insuficiente pelas Forças Armadas.

O presidente anunciou a nova votação, embora sem uma data para que fosse realizada, após um relatório preliminar de auditoria da eleição de outubro feito pela Organização dos Estados Americanos (OEA) apontar ter identificado várias "irregularidades".

O que disse a OEA?

A OEA determinou ser estatisticamente improvável que Morales tenha vencido pela margem de 10% necessária para evitar um segundo turno, conforme determina a lei eleitoral do país.

A auditoria do órgão internacional também encontrou registros com alterações e assinaturas falsificadas. O relatório de 13 páginas afirma que, em muitos casos, a cadeia de custódia das atas de votação não foi respeitada e que houve manipulação do sistema de computador.

"As manipulações ao sistema de computadores são de tal magnitude que devem ser profundamente investigadas pelo Estado boliviano para chegar ao fundo e negar as responsabilidades desse caso grave", disse o relatório.

Morales anunciou então novas eleições e a renovação de todos os membros do Supremo Tribunal Eleitoral (STE), que foram duramente criticados pela forma como foi feita a contagem dos votos, algo também recomendado pela OEA.

 

 

Mas o procurador-geral da Bolívia, Juan Lanchipa, foi além e deu início a uma investigação por crimes comuns, eleitorais e de corrupção contra membros do Supremo Tribunal Eleitoral e pessoas envolvidas nos eventos "irregulares" mencionados pela OEA.

Vários ministros e políticos ligados a Morales já haviam renunciado, incluindo o ministro de Minas, César Navarro, e o ministro de Hidrocarbonetos, Luis Alberto Sánchez, além do governador de Cochabamba, Iván Canelas, entre outros.

O candidato de oposição Carlos Mesa, que ficou em segundo na eleição de outubro, havia dito que Morales não deveria se candidatar novamente. Enquanto isso, o líder da oposição em Santa Cruz, Luis Fernando Camacho, insistiu que Morales deveria renunciar.

Candidatura contestada e acusações de fraude

No poder há mais de 13 anos, Morales foi o presidente boliviano que esteve no cargo por mais tempo na história do país — e o primeiro indígena a estar nesta posição.

Uma mudança constitucional aprovada em 2009, que estabeleceu a possibilidade de reeleição presidencial para dois mandatos consecutivos de cinco anos cada, permitiu que ele disputasse a reeleição em 2010 e 2014.

Em 2016, os partidários de Morales convocaram um referendo para modificar a Constituição novamente, para permitir que ele concorresse a um quarto mandato em 2019. Mas a proposta foi rejeitada pela maioria dos eleitores por uma pequena margem.

Mas, um ano depois, o presidente conseguiu a liberação do Tribunal Constitucional para disputar a reeleição indefinidamente. A Corte determinou em novembro de 2017 que o limite de dois mandatos presidenciais era "uma violação dos direitos humanos". A oposição acusou o tribunal de passar por cima do resultado do referendo.

Assim, ele concorreu ao quarto mandato consecutivo já com sua candidatura sendo contestada por seus opositores. Os problemas de Morales começaram na mesma noite das eleições, quando o STE suspendeu a rápida contagem dos votos quando a apuração estava 83% concluída. Uma tendência indicava que haveria um segundo turno entre o presidente boliviano e Mesa.

No dia seguinte, a apuração foi retomada com 95% dos votos contabilizados e indicando que Morales venceria no primeiro turno por uma margem estreita, mas suficiente para lhe garantir o quarto mandato.

As suspeitas levantadas pelos estranhos movimentos do STE levaram a oposição a apontar ter ocorrido uma fraude nos resultados. Muitos bolivianos, que começaram a se mobilizar nas ruas. A OEA e a União Europeia pediram que fosse realizado um segundo turno.

 

Mas Morales insistiu que havia vencido as eleições e, em resposta às manifestações da oposição, pediu aos seus apoiadores que "defendessem a democracia" nas ruas e impedissem um "golpe de Estado".

Desde então, houve intensos protestos em todo o país. Críticos e apoiadores de Morales se enfrentaram nas últimas semanas. A violência deixou pelo menos três mortos e centenas de feridos.

Os distúrbios policiais foram relatados em vários lugares, incluindo La Paz, onde a polícia deixou o governo boliviano e a sede do Legislativo sem proteção. Por sua vez, as Forças Armadas haviam dito que não agiriam contra os manifestantes.

 

ItapebiAcontece / Terra

 

 

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